Rota do Maciço Central da Serra da Estrela_PR5
Se queremos mostrar a nós mesmos o quanto nos sentimos especiais, aventureiros e audazes, a Serra da Estrela é um bom pretexto para sentirmos na pele as sensações de liberdade e de superação de um bom desafio.
Começamos por sentir o silêncio, respiramos profundamente, fechamos os olhos e assim que pestanejamos vemos a imensidão que está à nossa volta, sentimos de imediato que pertencemos aquele lugar, somos absorvidos pela beleza, pela autenticidade, pela liberdade, pelo desprendimento fisico e vamos a qualquer lugar que tinhamos em nossa mente, desta vez e com o devido planeamento prévio aventuramo-nos pela rota do seu maçico central.
Objetivo: Rota do Maciço Central da Serra da Estrela_PR5
Altitude: Entre 1423 e 1931 m
Tempo: 5 H.
Distância: 11 Kms circular
Dificuldade: Difícil
A emoção de entrarmos pela montanha adentro é sempre grande, percorrer trilhos, parar para observar paisagens, distâncias, absorver o ar puro e fresco e sentirmo-nos majestosos por estarmos naquele lugar, é tão soberbo que se torna difícil transmitir verbalmente ou por escrito o que se sente, costumamos dizer que o melhor que há é passar pela experiência, sentir e guardar para si a não ser que encontre palavras para transmitir o que viu e sentiu, tarefa difícil mas fazemos uma tentativa.
Estamos em pleno Inverno, a temperatura está baixa, a aventura tem alguma dificuldade pela sua extensão tendo em conta o tipo de terreno à base de rocha e declives, sabemos que há gelo, frio, vento mas o sol acompanha-nos o tempo todo.
Partimos da entrada do Covão D’Ametade, seguimos a placa com PR5. A imponência retratada naquele lugar pelos Cântaros Gordo e Magro é magnificente, estamos bastante emocionados pela aventura que nos aguarda, damos inicio pelo trilho conducente à placa dos Fantasmas e seguimos na direção do Vale da Candeeira. Quando chegamos à cortada para a Lagoa do Cântaro somos tentados a virar à esquerda mas acalentamos as ideias e seguimos para o Vale da Candeeira que fica mais abaixo com derivação à direita.
Paramos para observar à nossa volta, do nosso lado direito vemos os Poios Brancos, a Serra de Baixo, a estrada para Manteigas e abaixo deste acesso sabemos que estão doze kms do místico Vale Glaciar. Do nosso lado esquerdo ergue-se o Cântaro Gordo, a escassos metros de ilusão óptica está sua majestade, o Cântaro Magro.
Prosseguimos e começamos o primeiro contato visual com o Vale da Candeeira, iniciamos descida, surgem os primeiros cuidados a ter com o gelo pois todos os pequenos cursos de água que por ali escorrem ficaram totalmente estagnados de forma sólida, brilham ao sol mas o frio presente não permite qualquer transformação de estado.
Enquanto descemos numas rochas avistamos um esquilo, deve ter-nos achado tão estranhos que após nos ter fitado com os seus olhitos pequenitos castanhos deu meia volta e saltitou encosta abaixo com o seu farto rabo, ainda pedimos um registo fotográfico mas um esquilo discreto presa-se pela sua privacidade.
Chegamos ao Vale da Candeeira, faz lembrar um vale jurássico de tão amplo, de tão natural, de tão selvagem, atravessamos e este será o único lugar desta rota que encontramos plano pelo que aqui aproveitamos para aligeirar o passo e ganhar tempo. É difícil, pois a emoção de ali estar prende-nos ao chão, sentimos o capim seco nos pés, sentimos uma força interior inexplicável. Seguimos na direção da primeira picada em rocha, fazemos escalada livre, memorável é, mas apresenta alguma dificuldade.
A seguir a estas primeiras ascensões em rochedo aparece-nos como que por magia um dos muitos lugares encantadores que esta rota tem, a Lagoa da Paixão, discreta, embalada por diversas formações rochosas no seu contorno, a água está tranquila, são várias as lendas sobre esta lagoa e como qualquer lenda por si só nos sabe sempre bem ler, pessoalmente, a que mais gosto é a de que a Lagoa engoliu o corpo de Santa Ana, traz-nos um sabor a paixão apesar de trágica.
Aproveitamos o redor da Lagoa para fazer o banquete da hora de almoço, apesar que enquanto por aqui andamos não há horários, não há problemas, não há pensamentos sobre nada nem ninguém, ali somos nós e a natureza por isso nos sentimos tão bem, felizes e leves.
Caminhamos ao redor da Lagoa para voltarmos ao trilho, continuamos em ascenção na rocha, encontramos blocos graníticos colossais de toneladas imensuráveis, vemos verdadeiras cascatas de gelo, há dezenas delas e cada uma com seu formato peculiar, até parece que num determinado momento por ali passou uma fada com a sua varinha de condão fez perlimpimpim e tudo congelou repentinamente.
O seguimento do trilho continua a puxar pela nossa resistência, o terreno que pisamos é apenas em rocha, as cascatas e colunas de gelo são imensas, fenómeno que encontramos apenas devido à Estação do ano em que nos encontramos, os cenários arrebatam-nos o coração, o sentimento que carregamos é de felicidade por estarmos num lugar tão bonito, tão puro, de uma natureza tão ímpar e selvagem o que lhe confere uma beleza extraordinária e só por isto se justifica o quanto nos sentimos felizes, diria mesmo totalmente encantados.
Chegamos à zona das Salgadeiras onde, por um curto tempo aliviamos das subidas mais agrestes, as Salgadeiras e as charcas, pequenas lagoas de origem glaciar, totalmente naturais regalam as vistas em qualquer altura do ano porém, na época estival fazem de veraneio para quem estica as pernas por umas centenas de metros vindos da estrada que passa ali perto.
Após deixarmos estas lagoas e charcas voltamos à carga muscular nas pernas até atingirmos o topo do Cântaro Gordo, a bravura e amontoado das rochas deixa-nos perplexos mais uma vez tal é a intensidade de granito que parece ter sido ali despejado, são de um tamanho colossal, caminhamos sobre elas, uma a uma, aqui, neste lugar, mais uma vez nos reduzimos à infinidade de seres perante a grandeza magistral da paisagem que nos envolve.
Atingimos a altitude máxima e por momentos parece que nos transformamos nuns pássaros gigantes com asas totalmente abertas sobrevoando bem lá no alto.
O Cântaro Magro, esse louco de tal grandeza fica à direita, imaginando uma linha reta é como se lhes estivéssemos no topo, aos seus pés, bem lá ao fundinho está o Covão Cimeiro que serve de berço ao Rio Zêzere.
Preparamo-nos para descer e sabemos que vai ser o cabo dos trabalhos, é uma descida violenta, testamos travão nas rótulas e depressa percebemos o quanto valia mais fazer subida do que descida de tão abrupta que é até ao Covão Cimeiro.
Assim que chegamos, apesar de aliviarmos um pouco repomos as vitaminas com uma doce tangerina e ganhamos coragem para a etapa final, fazemos umas escorregadelas nas rochas e continuamos em descida a pique até atingirmos o místico Covão D’Ametade.
Em jeitos de conclusão diria que, apesar de dura terá como ideal de fazer com temperaturas mais baixas, o esforço físico é grande e o calor não será o melhor aliado. No final o que sentimos é uma grande vontade de voltar a fazer esta rota porque qualquer dificuldade que tenhamos sentido é literalmente abafada com a derradeira beleza e emoção que nos provoca.